"O que é uma pessoa?" foi a pergunta final deste que foi o septuagésimo Café Filosófico. Antes porém de enfrentarmos esta questão o nosso Diálogo aprofundou algumas questões relacionadas com o problema da identidade (material e pessoal) que nos ajudaram a ganhar uma maior compreensão sobre a questão da pessoalidade.
Como acontece em todas estas sessões é quem participa no Café Filosófico que é responsável pelo que lá se passa. Só isso pode explicar a riqueza destas sessões que só quem nelas participa realmente pode atestar, mas que as notas que a Chantal Guillonato costuma escrever e as fotografia que o José Rui Correia costuma tirar muito fielmente reproduzem.
Notas de Chantal G. no 70º Café Filosófico
Identidade Material e Identidade Pessoal
A ponta do marcador foi espremendo fios de tinta preta, tatuando no quadro a representação artística (do Tomás) de dois barcos. Um de madeira e outro de metal.
Teseu tinha um barco de madeira cujas peças, cansadas, foram sendo substituídas e passou a ter um barco de metal.
O barco de madeira é o mesmo que o de metal?
* Não, porque se alteraram as características materiais do próprio objecto (Cristina);
* Sim, porque manteve a mesma forma (Armanda);
* Não, porque mudou a matéria (Cristina Coelho);
* Sim, porque o seu desígnio é o mesmo (Henrique);
* Sim, porque a percepção do observador é a mesma – mudança gradual (Jorge);
Introdução de um novo dado:
Com as peças de madeira provenientes do primeiro barco, o marinheiro de Teseu criou um novo barco.
Esse barco é o mesmo que o primeiro?
Esse barco é o mesmo que o primeiro?
- Os «materialistas» (que defendem que a identidade é dada pela matéria) devem defender que é o mesmo barco uma vez que o material é o mesmo (Henrique);
- Não, porque o seu construtor/dono não é o mesmo (Chantal);
- Não, porque o dono não é o mesmo (Leonilde);
- Não, porque as peças do barco de madeira foram-se gastando. A forma não seria a mesma (Guiomar);
- Se Teseu viajasse a cavalo e não de barco, qual seria a sua percepção ao chegar ao destino? Para ele, tratar-se-ia de uma mudança abrupta mas para os marinheiros que viajaram no barco de uma mudança gradual (Paulo);
A ponta do marcador volta a ser solicitada e ressuscita Teseu com 1 e com 90 anos.
O Teseu com 1 ano é o mesmo que com 90?
O Teseu com 1 ano é o mesmo que com 90?
- Sim, porque há aspectos contínuos na sua relação consigo mesmo: memória(Henrique);
- Não (e a memória contribui para isso), porque vivemos experiências diferentes (Leonilde);
- Sim, porque o pensamento mantém-se (Jorge Ferro Rosa);
- Sim, porque temos os mesmos genes (Zé Rui);
- Sim, porque a personalidade é a mesma (Joana);
- Não, porque a personalidade muda (Alexandre);
- Sim, pelos genes apenas (Vera);
- Sim, porque apesar das transformações a pessoa é a mesma (Moisés);
- Não, porque não há continuidade na memória (Leonilde);
- Não, porque há um factor base que é o tempo. Tudo é mutável (Cristina);
Nota de Leonilde: o tempo não existe sem memória (Sto Agostinho)
Nota de Chantal: tempo medível nesta dimensão. Fora desta, o argumento do «tempo» deixa de ter validade. Pós de «essência/alma».
Nota do Paulo: há coisas que não mudam, como por exemplo o nome do Teseu.
Nota do Tiago: se algo se pode manter no tempo, isso prova que o argumento de «tempo» não é válido.
- Sim, de um ponto de vista formal: os pais de Teseu são os mesmos e ele nasceu num dia X (Jorge Cunha);
- Sim, porque apesar de mudanças radicais que possam fazer (mudar de nome, religião, país), as pessoas mantêm uma essência (Maria Manuel);
Nota/Desabafo da Vera: (o método) "é" e "não é". Não é forçoso escolher uma posição.
Síntese final. O que é uma pessoa?
- Ser consciente e responsável (Jorge Ferro Rosa);
- Indivíduo manifestado (Henrique);
- Ser humano que nasceu e há de morrer (Jorge Cunha);
- Contentor e conteúdo (Paulo);
- Existência física e espiritual (Cristina);
- Características que definem o Eu (Joana);
- Ser humano socializado (Tiago);
- Ser humano inserido numa sociedade, num momento e numa cultura (Vera);
- Materialização da alma (Chantal).
Os fios de tinta no quadro recolheram-se no novelo de lã imaginário que permitiu um dia a Teseu sair do Labirinto. O homem que entrou e saiu, depois de ter morto o Minotauro, era o mesmo?
Até à próxima amigos!
Tomás
Tomás
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