A inconsciência de um louco torna-o livre?
Objectivos
Aprofundar e problematizar conceitos.
Com este exercício quisemos mostrar aos alunos a importância central que os conceitos ocupam numa investigação filosófica, assim como o papel das perguntas no aprofundamento e compreensão desses conceitos.
Estrutura da sessão
1 – Curta conversa com os alunos para identificar alguns conceitos filosóficos.
2 – Ronda de perguntas sobre cada um dos conceitos.
3 – Aprofundamento de um dos conceitos: Liberdade (escolhido pela turma)
4 – Respostas à questão escolhida para o conceito de liberdade.
5 – Identificação dos conceitos operacionais e sua problematização
Resumo
A pretexto da apresentação de cada aluno mantivemos uma curta conversa com cada um deles onde se procurou “fazer sair” alguns conceitos que depois pedímos à turma para aprofundar e problematizar na forma de uma pergunta. O aluno responsável pelo conceito escolhia aquela que considerava ser a melhor pergunta, segundo os critérios de clareza, pertinencia e capacidade de levantar problemas filosóficos (aqui pretendemos mostrar aos alunos a necessidade de qualquer avaliação se reger por determinados critérios).
1 - Conceitos encontrados:
Altruísmo; Beleza; Informação; Discrição; Memória; Inteligência; Liberdade.
2 – Perguntas sobre cada conceito:
1) Altruísmo: Será que o altruísta também pensa em si próprio? (Maria)
2) Beleza: A beleza pode encobrir os verdadeiros gostos das pessoas? (Maria)
3) Informação: O informador foi informado por quem?(Inês) – esta pergunta suscitou uma breve discussão em volta da questão da verdade.
4) Discrição: Será que uma pessoa é discreta pois não é suficientemente boa? (Maria)
5) Memória: Uma memória vale mais ou menos que um projecto para o futuro? (Inês)
6) Inteligência: A inteligência pode afastar-nos das pessoas que gostamos? (Maria)
7) Liberdade: Somos livres?
3 – Aprofundamento de cada um dos conceitos:
Depois de discutirem em grupo cada um dos conceitos os alunos responderam por escrito e na forma de um argumento curto a esta última questão relativa à liberdade. Foram escolhidos dois argumentos:
4 – Respostas à questão escolhida relativa ao conceito de liberdade: Somos livres?
i) Não somos livres pois temos sempre alguma obrigação implicada por outros ou por nós.
ii) Sim, somos livres porque a nossa liberdade é apenas determinada pela nossa consciência.
5 - Identificação dos conceitos operacionais e sua problematização
Por fim resolvemos aprofundar esta resposta e pediu-se à turma que lhe colocassem uma questão (identificou-se o seu conceito principal: consciência)
Por fim a turma escolheu as duas perguntas (ver ponto 2) que melhor permitiam aprofundar a questão da consciência em relação ao conceito de liberdade.
a) E se não tivermos consciência, somos livres?
b) A inconsciência de um louco torna-o livre?
- Fim da sessão
Nota Final
Esta sessão foi desenvolvida segundo o pressuposto de que o ensino das diferentes fases do método filosófico (e os diferentes tipos de raciocínio aplicados a cada uma dessas fases) deve ser explícito, ou seja, deve ser ensinado directamente ao aluno com a indicação exacta do que é que está a fazer naquele preciso momento, quer seja aprofundar um problema através de uma pergunta, a encontrar um conceito que lhe permita avançar com a investigação, a arriscar uma hipótese na forma de um argumento ou a analisar um argumento.
Com este tipo de exercícios pretendemos que os alunos ganhem consciência desses diferentes momentos de uma investigação filosófica (neste caso os momentos da problematização, conceptualização, argumentação) e que avancem de forma competente em cada um deles, por oposição à maneira confusa e mais ou menos intuitiva como, à imagem de tantos adultos, normalmente raciocinam.
Glossário
conceito operacional
A introdução de um novo conceito numa reflexão filosófica permite:
Problematizar uma posição - perante a proposição de que a “certeza é igual à verdade”, o conceito de “erro” ajuda a pôr essa ideia em causa;
Unir dois conceitos – para justificar a ideia que “opinião e verdade são a mesma coisa”, o conceito de “crença” pode servir para unir esses dois conceitos num conceito mais abrangente: “Opinião e verdade são crenças”;
Resolver um impasse - o conceito de “verdade pessoal” pode ajudar a ultrapassar a dicotomia entre a crença numa “verdade absoluta” e a crença na “inexistência de verdade”.
Distinguir dois conceitos - a noção de “raciocínio” pode ajudar a distinguir os conceitos de “conhecimento” e “sentimento”.
Clarificar uma ambiguidade – o conceito de “intencionalidade” pode ajudar a distinguir os sentidos diferentes da proposição “estava consciente do que fazia”.
Aprofundar um conceito - a noção de “conhecimento intuitivo” pode aprofundar a questão dos diferentes tipos de conhecimento.
Formular uma definição - qualquer definição (não circular) precisa de um conceito novo que explique o sentido do que se quer definir.
conceptualização
A capacidade que os seres humanos detêm de integrar e organizar as informações que lhes chegam pelos sentidos, passando dessa forma do nível perceptual, que partilhamos com os animais, para o nível conceptual único nos seres humanos.
Existem diversas formas de se fazer sair os conceitos de uma discussão:
Que nome se dá a uma pessoa que pensa assim?; Que conceito fundamental subjaz a esse argumento?; Qual o oposto desse conceito?; Que argumento defenderia quem preferisse esse valor/conceito?; etc.
Os conceitos são os instrumentos de investigação filosófica por excelência
problematização
O ser humano é verdadeiramente livre de agir como quer?
Problematizar é a capacidade para desenvolver e aprofundar problemas.
Esta capacidade está intimamente ligada à nossa capacidade de conceptualizar, uma vez que, para aprofundar ou desenvolver um problema temos necessariamente de utilizar novos conceitos.
Desenvolver e aprofundar filosoficamente o problema exemplificado é procurar saber que conceitos é que lhe podem estar associados e perceber as suas implicações:
Posso ser consciente dos meus desejos? (consciência)
Estarei condicionado a ter determinados desejos? (determinismo)
A vontade é capaz de contrariar um desejo? (livre-arbítrio; vontade livre)
Outra forma de problematizaro é relacionando duas ou mais proposições diferentes, quer articulando-as numa problemática (na forma de uma pergunta) quer resolvendo-as com um novo conceito (na forma de uma nova proposição). Por exemplo, ao tratar a questão da generosidade deparamo-nos com duas proposições disitintas: A generosidade é algo inerente a todo o ser humano e A generosidade só se manifesta em actos humanos com consequências sociais. Aqui a problematização pode adoptar a forma de uma pergunta que abra ainda mais a rede de conceitos a explorar, A generosidade humana pode ser anulada pela própria inserção involuntária do homem numa sociedade?
Sem comentários:
Enviar um comentário